Deixar os cabelos brancos – um ato de coragem social

Os primeiros cabelos brancos começaram a aparecer por volta dos meus 23 anos. Naquela época, final da década de 70, estava na moda fazer reflexo, cuja técnica era descolorir algumas mechas de cabelo e, assim, eu ia escondendo os brancos.

Cansada de fazer reflexo, comecei a fazer tintura das mais variadas cores, o que perdurou por pelo menos vinte e cinco anos. Quando eu estava com cinquenta e cinco anos não aguentava mais tentar cobrir os cabelos brancos que só aumentavam. 

Em 2008 uma amiga comentou sobre um artigo do jornal O Estado de São Paulo “Brancas de neve” mencionando o livro “Meus Cabelos Estão Ficando Brancos”, da jornalista e escritora americana Anne Kreamer. Me entusiasmei!

Alguns dias depois a minha amiga me entregou o jornal. Li a matéria e, imediatamente, comprei e livro (tradução de Helena Londres, editora Globo, 2007) que eu li em poucas horas. Decidi encarar o desafio. 

Nessa época eu ainda trabalhava normalmente. Em quinze dias vi a raiz branca aumentando e tentei não me desesperar. Olhava no espelho e via uma cabeça colorida, saindo da raiz branca, passando por tons de laranja até chegar no marrom desbotado das pontas.

E assim fui, até que uns dois meses depois, uma cliente me perguntou se eu estava doente, eu respondi que não e perguntei porque. Ela me disse que a irmã dela, que também era minha cliente e tinha estado no escritório alguns dias antes, tinha dito que me achou “muito acabada” e que alguma coisa séria estava acontecendo comigo. 

Nesse momento, acendeu um sinal de alerta, deixar os cabelos brancos estava colocando em risco o meu trabalho e eu precisava preservar a clientela. Conclusão, joguei a toalha e voltei a pintar os cabelos o que ocorreu até março de 2019, quando então parei definitivamente. 

Hoje estou aposentada, grisalha assumida e sem nenhuma preocupação com a minha identidade visual, mas reconheço que o alerta recebido da minha cliente ficou registrado como momento marcante desta vida.